Por: Osmar Alves Marques ( R00018)
Sociedade se mobiliza para que a conferência, que
será realizada em junho de 2012, no Rio de Janeiro, seja muito mais que um
balanço da ECO 92 e priorize ações efetivas.
Reportagem de Sucena Shkrada Resk
Não há como negar que a comemoração de duas décadas
da Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, a ECO 92,
também conhecida por Cúpula da Terra, deverá ter um grande significado
simbólico durante a realização da Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável – Rio+20, entre 4 e 6 de junho de 2012. Até hoje, o
evento é considerado o principal marco histórico socioambiental, mas o que
muitos temem nos bastidores da preparação da futura conferência é a
possibilidade de o evento se restringir a um simples balanço e propostas no
papel, já que não tem caráter deliberativo, não representando avanços
significativos na busca pela sustentabilidade no planeta. Organizações
não-governamentais (ONGs) e movimentos sociais e empresariais já se mobilizam
para pressionar e propor pautas de políticas públicas aos governos, a fim de
que a Rio+20 possa resultar em ações efetivas. Para isso, está em curso a
elaboração de uma agenda de eventos extra-oficiais que antecederão o encontro
oficial. No centro das discussões, está o tema “Economia Verde, no contexto do
desenvolvimento sustentável e da extrema pobreza”. Nesse sentido, o
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) chegou a lançar, em
fevereiro deste ano, o relatório “Rumo a uma Economia Verde: Caminhos para o
Desenvolvimento Sustentável e a Erradicação da Pobreza”. O documento sinaliza
que, para concretizar a transição para uma “economia verde”, seria necessário
um investimento de 2% do Produto Interno Bruto Global (PIB) – cerca de US$ 1,3
trilhão – em dez setores: agricultura, edificações, energia, pesca,
silvicultura, indústria, turismo, transporte, água e gestão de resíduos. Mas
diretrizes sobre essa pauta ainda estão longe de serem definidas.A Rio+20
também será palco para se avaliar os resultados práticos de importantes
documentos gestados a partir da ECO 92, como a Agenda 21, as Convenções sobre
Mudança do Clima e a Diversidade Biológica, a Declaração de Princípios sobre as
Florestas, de Combate à Desertificação, entre outros que foram elaborados
posteriormente, como a Carta da Terra, em 2000.
Mobilização da sociedade e o FSM 2012
No Brasil, foi formado o Comitê Facilitador da
Sociedade Civil Brasileira para a Rio+20. Segundo Aron Belinky, coordenador de
Processos Internacionais do Instituto Vitae Civilis, que representa o Fórum
Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento (FBOMS) na Coordenação Nacional do Comitê, o papel do grupo –
atualmente formado por 14 redes – é trazer mais participantes para o debate até
o ano que vem. “Nossas ações são elaboradas por meio de grupos de trabalhos. Um
deles é o de formação e mobilização, que deverá levar os temas em discussão
para a sociedade e cuidará da organização do evento paralelo previamente chamado
de Cúpula dos Povos, que terá a participação da sociedade civil”, pontua.
O encontro popular, segundo ele, deverá começar
antes, por volta do dia 21 de maio de 2012. “Além de representantes do Brasil,
outros do Canadá, França, Japão, e de alguns países da América Latina já estão
envolvidos nestas ações”, adianta o ambientalista. “Na Cúpula dos Povos,
queremos que seja garantido que a economia verde seja avaliada como um
interessante indutor de sustentabilidade, desde que abranja as questões
sociais, além das ambientais, e tenha sempre presente a questão da qualidade de
vida dos cidadãos, além da ecoeficiência.”
Uma outra frente da sociedade civil rumo à Rio+20
se dará no âmbito do Fórum Social Mundial (FSM). A decisão foi tomada ao final
da edição deste ano, em Dacar, no Senegal. Segundo o empresário e ativista da
área de responsabilidade social, Oded Grajew, que integra o Comitê
Internacional do FSM – que ocorrerá entre 27 e 31 de janeiro de 2012 (data
sujeita a alterações) –, a edição internacional descentralizada do evento terá
como principal pauta a temática ambiental, voltada à conferência.
“O FSM não representa as elites econômicas e
exigirá uma demanda de mobilização da sociedade sobre outro modelo de
desenvolvimento. Trataremos de propostas de mudança da matriz energética para a
renovável, da questão nuclear, das hidrelétricas em confronto com as populações
indígenas, do modelo de consumo e resíduos orgânicos, entre outros”, aponta
Grajew. Segundo ele, a meta é propor políticas públicas ao governo e
informações sobre indicadores quanto à grave situação do modelo atual de
desenvolvimento, que leva ao esgotamento de recursos naturais e ao aumento das
desigualdades.
“Como 2012 será também um ano de eleições em alguns
países importantes como EUA, Alemanha e França, isso prejudica decisões. Talvez
essas nações não queiram assumir alguns compromissos, que podem comprometer os
resultados nas urnas”, alerta. Ele reforça que, no contexto da Economia Verde,
as discussões do FSM permanecerão voltadas a questões sociais, ao combate às
desigualdades.
No campo empresarial, Grajew informa que algumas
iniciativas em andamento são do Instituto Ethos, que lançou, em fevereiro deste
ano, a Plataforma por uma Economia Inclusiva, Verde e Responsável. “A
proposta é que possa ser apresentada também uma agenda de sustentabilidade
urbana para os candidatos às eleições municipais brasileiras, no ano que vem. O
projeto será amadurecido na Conferência Ethos, em agosto deste ano.”
Governança e desenvolvimento sustentável
Um tema complexo que estará na Conferência, segundo
Belinky, diz respeito à governança em um cenário de desenvolvimento
sustentável. “Este tema está sendo pouco debatido oficial e extra-oficialmente.
Deve ser visto não como uma discussão sobre burocracia, mas como uma condição
necessária para encaminhar as decisões e recomendações que se tomem na
conferência”, analisa.
Belinky afirma que, se por um lado, hoje se enxerga
o desenvolvimento sustentável no conjunto, as instituições internacionais e
internas a cada país são estanques. “Umas atuam no campo econômico, como o
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o FMI e a Organização Mundial do
Comércio (OMC), que não se conectam nas dimensões sociais e ambientais. Já a
Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Mundial do Trabalho (OIT),
que têm algum poder político, estão desconectadas do lado ambiental. A ideia é
integrá-las à questão do desenvolvimento sustentável”.
No caso da questão ambiental, as discussões levam à
constatação de que não existe nenhuma organização internacional com real poder
regulatório. “O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) é um
dos com menor orçamento na ONU e depende de adesões voluntárias. Não é
essencial dentro do sistema, participa quem quer. Pode encaminhar, no máximo,
estudos, recomendações, mas sem poder regulatório”.
Como primeiro passo, uma das propostas que serão
defendidas pela sociedade civil é que haja uma resolução para se criar uma
agência ambiental internacional, aprimorando o funcionamento do Pnuma ou por
meio de sua união com outras agências. “O governo brasileiro, inclusive, tem
defendido uma 'agência guarda-chuva', que tenha sob ela várias agências
internacionais do sistema ONU.” As entidades, segundo Belinky, enxergam que
existe uma necessidade tanto ética quanto política e econômica de tirar as
pessoas da pobreza. “Isso não significa que deverão ter padrão de consumo
insustentável, como o norte-americano e europeu. Não é objetivo estender a
sociedade perdulária”, adverte.
As expectativas sobre os resultados da Rio+20
caminham na direção de dois extremos. “Será uma grande oportunidade ou
nulidade. A conferência pode fazer uma convergência, desatar nós ou, então, se
não se dispuser, será um ponto de jogar conversa fora. Mas de qualquer forma, a
mobilização de propostas da sociedade civil será um avanço. Ou os governos são
capazes de mostrar relevância no mundo contemporâneo ou são incapazes de
acompanhar o ritmo que a sociedade avança, se tornando um empecilho”.